Descrição
“… No dia em que a minha ex-mulher e eu assinamos o divórcio, descobrimos que havíamos sido casados por seis anos, seis meses e seis dias! Seis, seis, seis, o número da besta. Desde então ela pensa que eu sou o Diabo. Pelo menos não tem dito coisas muito boas a meu respeito. É tudo exagero dela. Juro. Não é de todo verdade que eu realizava torturas físicas em rituais satânicos no lugar das preliminares. Isso é uma meia-verdade. Ela não concordava quando eu queria usar o chicote. Cada um tem a sua fantasia, caramba! Eu já era assim quando ela me conheceu. Só uma chicotadinha, querida, para apimentar, você vai adorar. Ela não deixava. Tinha um estranho instinto de preservação das próprias costas. Nem tão pouco concordo quando ela dizia que durante a nossa relação eu exigia dela a alma, quando na verdade eu só queria que ela fosse minha por toda a eternidade. Nada mais. A eternidade não é tanto tempo assim, ora bolas. Se você não estava disposta a abrir mão da sua juventude e da sua liberdade por uma relação que se torna mais tediosa a cada dia que passa por que se casou, querida? Por hoje é só, seus levadinhos. Boa noite, boa morte, Rio de Janeiro.
Aplausos. Gritos que fundamentam a ilusão de sucesso. Amigos em novo coro: “Bro-xa, bro-xa, bro-xa”.
Oculta na plateia, Débora se orgulha de si mesma por ter convencido Ramon, há pouco mais de um ano, a subir aos palcos com humor autopurificante. Rapidamente, ela se retira sem ser vista. “Isso aqui não tem mais nada a ver comigo”.
(Ano 2033 d.c. com comentários de Samara em 2060 d.c).
Mais do que o resgate do amor do pai pela filha, mais do que uma aventura de desejo bang-bang, mais do que um stand-up comedy para mentes fora do comum, mais do que uma experiência em um laboratório onde a mulher ultrapassa o costume das pessoas de bem, mais do que o labirinto, mais do que o sotaque carioca, mais do que o canto da torcida, algo próximo a um ritual para remendar corações despedaçados através do elixir da juventude que mistura sentimento, muito sentimento, com ironia, ironia a gosto, receita existencial batizada por Ramon Godot de devoradoração.
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